Na nota hoje tornada pública, assinada pela sua presidente, Maria Teresa Féria de Almeida, a associação pede ao procurador-geral da República, Amadeu Guerra, que preside ao CSMP e a quem compete "promover a defesa da legalidade democrática", que "repondere a sua deliberação no sentido de respeitar e cumprir os normativos internacionais e constitucionais".
Sobre o aviso, a APMJ afirma que este "lhe suscitou o mais profundo espanto, consternação e repúdio", pede a anulação das normas "que invertem o caminho da especialização do combate à violência contra as mulheres e de proteção de crianças" e insta o Governo e a Assembleia da República a "reforçar urgentemente" os meios do Ministério Público, "sob pena de serem corresponsáveis pela ineficácia no combate à violência que tão desproporcionalmente afeta as mulheres portuguesas".
A posição da associação é justificada por "aquele aviso se constituir como um instrumento de inversão das conquistas profissionais no combate à violência contra as mulheres e violar, de forma notória, clara e ostensiva, as normas relativas à proteção na maternidade, doença, assistência a terceiros, igualdade no acesso a cargos e conciliação da vida profissional com a pessoal e familiar".
Tal como o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) já tinha afirmado, também as Mulheres Juristas entendem que este movimento, e as regras de agregação que competências de magistrados que determina, representa "um enorme retrocesso na especialização", colocando em causa investigações e a especialização em jurisdições nas quais a violência contra mulheres e crianças representa "uma grande fatia dos processos", como a jurisdição dos tribunais de família.
Para a APMJ, as disposições do movimento de magistrados, que o CSMP justificou com falta de meios humanos, contrariam convenções e regulamentos internacionais sobre direitos das mulheres e discriminação de género, assim como a Constituição portuguesa e o Estatuto do Ministério Público.
A associação referiu que as normas do aviso que excluem candidaturas de magistrados que prevejam poder vir a estar impedidos para o serviço num período superior a 60 dias entre 01 de setembro de 2025 e 31 de agosto de 2026 atingem sobretudo as mulheres, em maioria no Ministério Público, cujos quadros atuais são compostos por 1.183 mulheres e 539 homens.
A APMJ critica a deliberação que levaria as mulheres magistradas a terem de "assumir o compromisso, válido por doze meses, de que não engravidarão, não adoecerão, não assumirão funções de cuidadores informais de familiar(es), e de que se não se submeterão a tratamentos de fertilidade".
"Ao invés de a feminização da profissão ser acompanhada de reformas estruturais ao nível da conciliação do trabalho com a vida pessoal e de resposta a ausências ao serviço por força da maternidade e doença dos filhos, tarefas que ainda recaem sobre as mulheres, o CSMP decidiu optar por restringir o acesso das magistradas a determinados lugares, excluindo-as e penalizando-as pelo facto de serem mulheres", acusou a APMJ.
A APMJ afirmou que "não pode aceitar, assim, que a falta de meios humanos redunde na falta de especialização de magistrados/as do Ministério Público na investigação criminal de violência contra as mulheres e na jurisdição de família e crianças", nem que, "sob a falácia de que o incremento do número de magistradas mulheres como causa da morosidade da justiça, se vede o acesso de mulheres a lugares".
Numa audição parlamentar em setembro de 2024, num dos seus últimos atos enquanto procuradora-geral da República, a antecessora de Amadeu Guerra, Lucília Gago, provocou uma polémica ao referir-se ao elevado peso das mulheres na magistratura e às ausências prolongadas por natalidade quando apontava a falta de meios do Ministério Público.
Sobre o movimento de magistrados, a Procuradoria-Geral da República já veio rejeitar que esteja em causa a especialização de magistrados, afirmando que o objetivo é otimizar recursos.
IMA // FPA
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