Há um consenso entre os 32 aliados da NATO reunidos, esta terça-feira, em Haia: O mundo tornou-se um lugar muito mais perigoso nas últimas décadas e é preciso reforçar o contributo de cada país para a Defesa. Mas, a par dessa conclusão partilhada, nem todos concordam com o custo específico do rearmamento.
Enquanto o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, pede que o valor investido na área seja 5% do Produto Interno Bruto (PIB), a Espanha quer menos e essa posição tem despoletado críticas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aos espanhóis.
Que valores estão em causa?
O compromisso de aumentar as despesas com a defesa para 5% do PIB nacional de cada país da NATO até 2035 seria dividido em 3,5% para investimentos militares e 1,5% para infraestruturas de todos os tipos, desde estradas a redes de comunicação que possam ser usadas para fins militares, incluindo também uma cláusula de revisão das despesas e das necessidades de defesa dentro de quatro anos, em 2029.
Valores com que Espanha não concordou, chegando mesmo a pressionar e ameaçar quebrar o consenso caso não lhe fosse concedida flexibilidade suficiente para decidir sobre o aumento das despesas militares que, na opinião dos governantes do país, devem ser muito inferiores no caso espanhol.
A posição quase fez descarrilar o êxito prévio da cimeira, que tem também como objetivo enviar à Rússia a mensagem de que, apesar dos altos e baixos visíveis, a NATO continua unida e vai investir na defesa para desencorajar Moscovo avançar com qualquer tentativa de ataque.
Espanha garante que fechou acordo "flexível", mas Rutte desmente Sánchez
Na segunda-feira, véspera da cimeira, pareceu ter sido finalmente encontrada uma solução através de contorcionismo político, com o governo espanhol a afirmar que tinha garantido um acordo no seio da NATO que tornava "flexível" o objetivo dos Estados-membros, na sequência de uma negociada alteração ao texto final que vai sair da cimeira e que desvincula as metas a alcançar em termos de capacidades militares de uma percentagem do PIB.
Nesse novo texto da declaração final que está negociado, em inglês, substituiu-se a expressão "we" ("nós") ou "all allies" ("todos os aliados") por "allies" ("aliados"), "uma mudança fundamental que reflete a postura do Governo espanhol: nem todos os aliados estão obrigados a 5%", explicou à Lusa fonte oficial do executivo de Espanha.
Além disso, o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, e o primeiro-ministro de Espanha, Pedro Sánchez, trocaram cartas, que o líder do governo de Madrid tornou públicas, e em que o primeiro confirma que o objetivo dos 5% será "flexível".
"Entendo que Espanha está convencida que pode cumprir o novo acordo de Objetivos de Capacidade com uma trajetória de despesa inferior a 5% (3,5% em defesa estrita e 1,5% em gastos relacionados com a segurança) do PIB. (...) Posso confirmar-lhe que o acordo da próxima cimeira da NATO dará a Espanha flexibilidade para determinar a sua própria rota soberana para alcançar a meta dos Objetivos de Capacidade e os recursos anuais necessários em termos de percentagem do PIB para apresentar os seus próprios planos anuais", lê-se numa carta de Rutte a Sánchez.
Contudo, nesse mesmo dia, o secretário-geral da Aliança Atlântica rejeitou que Espanha esteja isenta do compromisso de investir pelo menos 5% do PIB na área da defesa, contradizendo declarações do primeiro-ministro espanhol.
E para Donald Trump... "Espanha é um problema"
Antes de sair dos Estados Unidos para se deslocar à cidade holandesa de Haia para participar na cimeira da NATO, o presidente norte-americano, Donald Trump, reiterou o apelo para que os aliados disponibilizem 5% do PIB à área da defesa, vincando que "Espanha é um problema" de "injustiça" por recusar tal ambição, em comparação com os "restantes" aliados.
Já em Haia, Trump divulgou uma mensagem que lhe foi enviada pelo secretário-geral da NATO, dizendo que os Estados Unidos "estão a partir para mais um grande sucesso" nos Países Baixos, onde os Aliados vão decidir o aumento das despesas com defesa.
"Vocês vão conseguir algo que nenhum Presidente norte-americano conseguiu em décadas", declarou Rutte.
A Europa vai pagar "um preço enorme" para financiar a defesa "como deve ser" e "essa será a sua vitória", escreveu ainda Rutte a Donald Trump, que critica frequentemente os poucos investimentos europeus.
Seguindo a mesma linha de Trump, o embaixador dos Estados Unidos na NATO, Matthew Whitaker, também falou de um "fardo" que deve ser comprovadamente suportado por "todos" os aliados.
As dúvidas sobre se Espanha vai ceder e investir os 5% ou poderá beneficiar de uma opção mais "flexível" prometem persistir até à última 'fotografia de família' tirada pelos líderes da NATO em Haia.
Kallas desvaloriza críticas de Trump a Espanha e espera "acordo"
A chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Kaja Kallas, foi das poucas líderes que se pronunciou publicamente sobre o assunto, afirmando que, apesar das "diferentes opiniões públicas internas" na Europa, é "sempre possível chegar a acordo".
"Quero dizer, somos 27 democracias no que respeita à União Europeia, por isso é claro que temos sempre questões diferentes e também temos opiniões públicas internas diferentes", disse Kallas aos jornalistas europeus em Haia.
"Temos de ter isso em conta, mas no final acabamos sempre por chegar a acordos", adiantou, falando a alguns jornalistas no centro de imprensa da cimeira da NATO.
A cidade holandesa de Haia acolhe, esta terça e quarta-feira, a cimeira da NATO, prevendo-se novo compromisso entre os 32 países aliados para gastarem mais em defesa face à instabilidade geopolítica mundial.
Portugal está representado na cimeira de Haia pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, e pelos ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa, Paulo Rangel e Nuno Melo, respetivamente.
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