O alerta faz parte do estudo 'Continuidade e Mudança nas Políticas Públicas em Portugal', da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), que analisa as três principais ferramentas à disposição dos governos para controlarem a direção das políticas públicas: as reorganizações administrativas, as alocações orçamentais e as nomeações para cargos dirigentes.
Neste âmbito, os investigadores alertam para o recurso ao regime de substituição, que "embora concebido para garantir a continuidade dos serviços em períodos de transição, tem sido frequentemente utilizado de forma prolongada, contornando os processos de seleção mais rigorosos e transparentes".
"Esta prática não só compromete a meritocracia e a profissionalização da administração pública, como também pode resultar em instabilidade e descontinuidade nas políticas setoriais", acrescentam.
Este "uso excessivo" tornou-se mais evidente "a partir do final da primeira década do século XXI" e "parece sugerir" que é usado "como instrumento para contornar os mecanismos de seleção baseados no mérito, como é o caso da CReSAP" (comissão que gere o recrutamento de dirigentes da Administração Pública), criada em 2011, aponta ainda o estudo elaborado por António F. Tavares, Patrícia Silva e Pedro J. Camões e que analisa a evolução das políticas públicas entre 1976 e 2020.
Deste modo, e apesar de reconhecerem a "flexibilidade" dada por este regime em situações emergentes, bem como o facto de ajudar "a evitar a rigidez burocrática" associada aos processos de recrutamento, os investigadores admitem que "pode ser necessário reforçar legislação", de modo a limitar o recurso e a duração destas nomeações.
E recomendam a "criação de um Observatório das Nomeações Públicas, integrado na CReSAP, mas com autonomia funcional", tendo em vista "monitorizar e avaliar todos os processos de nomeação, incluindo as nomeações em regime de substituição", e como forma de "reforçar a monitorização e transparência".
Em linhas gerais, este observatório teria quatro objetivos: "manter uma base de dados atualizada de todas as nomeações em regime de substituição, incluindo a sua duração, justificação e perfil dos nomeados", "emitir relatórios periódicos sobre padrões de utilização deste regime", "criar um sistema de alertas automáticos quando uma nomeação em regime de substituição ultrapassasse um determinado período temporal" e "disponibilizar publicamente esta informação através de uma plataforma digital de acesso livre".
Os investigadores propõem ainda como alternativa criar um "sistema de avaliação prévia obrigatória para nomeações em regime de substituição que ultrapassassem um determinado período (por exemplo, 90 dias)", sendo que este sistema "envolveria um painel técnico independente" e que o parecer deste painel fosse vinculativo.
"Estes mecanismos permitiriam maior transparência e responsabilização no uso do regime de substituição, sem comprometer a sua agilidade, quando verdadeiramente necessária", concluem.
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