Um parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre as competências e atribuições das polícias municipais confirmou que estas não podem mesmo fazer detenções, contrariando a posição do presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, que, em setembro do ano passado, deu ordens para que passassem a deter suspeitos de crimes na cidade.
O parecer foi solicitado pela anterior ministra da Administração Interna, Margarida Blasco, em setembro de 2024 e é datado de 27 de março. Segundo a atual ministra, Maria Lúcia Amaral, o documento foi recebido no ministério a 4 de abril e homologado pelo Governo no passado dia 21 de julho.
No entender do Conselho Consultivo da PGR, as polícias municipais têm competências "restritas" à cooperação na manutenção da tranquilidade pública e na proteção das comunidades locais e são como "serviços municipais", funcionando "na dependência do presidente da câmara municipal".
"Os agentes das polícias municipais [somente] podem deter suspeitos no caso de crime público ou semi-público punível com pena de prisão, em flagrante delito, cabendo-lhes proceder à elaboração do respetivo auto de notícia e detenção e à entrega do detido, de imediato, à autoridade judiciária, ou ao órgão de polícia criminal", lê-se no parecer.
Em reação ao parecer, Carlos Moedas defendeu "uma pequena mudança" na lei para permitir que a polícia possa deter suspeitos de crimes em flagrante delito.
"É uma questão que tem de ser clarificada e, pelos vistos, não foi neste parecer, portanto tem de a lei ser mudada [...] eu peço ao Governo que mude a lei", afirmou o social-democrata Carlos Moedas à Lusa, considerando que está em causa "uma situação dramática e que diminui os polícias municipais, que não são polícias de segunda, porque eles são PSP alocados à polícia municipal".
Em declarações aos jornalistas, Carlos Moedas defendeu que "os lisboetas hoje precisam de mais PSP" e "mais Polícia Municipal".
"Não é uma questão de qual é o governo, é uma questão de defender os lisboetas. Os lisboetas hoje precisam de mais PSP, precisam de mais polícia municipal. Isso é óbvio. Eu sei que há candidatos que defendem o contrário, que defendem que não deveríamos ter estas competências, que, no fundo, não defendem a polícia", atirou.
Dar mais competências à Polícia Municipal é defender os lisboetas.
— Carlos Moedas (@Moedas) August 5, 2025
E defender os lisboetas é estar ao lado dos polícias. pic.twitter.com/vDV7jYjyXC
Em paralelo, de acordo com o Diário de Notícias, a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), informou ter "instaurado processo administrativo para a averiguação" de ações levadas a cabo recentemente pela Polícia Municipal que culminaram com a detenção de vendedores ambulantes.
"Essas averiguações são normais. Gostava era de continuar a motivar a Polícia Municipal no seu papel, não só administrativo e de fiscalização, mas também um papel que tem de ser de ajuda aos colegas da PSP", considerou Carlos Moedas à TSF.
Em contrapartida, os vereadores da oposição na Câmara de Lisboa, designadamente PS, PCP, Livre, BE e Cidadãos Por Lisboa (eleitos pela coligação PS/Livre), criticaram a posição de Carlos Moedas quanto ao reforço de competências da polícia municipal e defenderam que o parecer da PGR "não pode ser ignorado".
Governo demorou quatro meses a homologar parecer da PGR. Ministra defende-se: "MAI não ocultou qualquer documento"
O Ministério da Administração Interna (MAI) justificou a demora de quatro meses na homologação do parecer da PGR com o contexto das eleições legislativas antecipadas.
Em declarações à Lusa, o gabinete da ministra Maria Lúcia Amaral afirmou que "o MAI não ocultou qualquer documento" e explicou que o documento foi recebido "já na vigência de um Governo de gestão, na sequência da dissolução da Assembleia da República e da convocação de eleições antecipadas".
A ministra da Administração Interna decidiu, então, homologar o parecer do Conselho Consultivo da PGR no dia 21 de julho, "após uma análise cuidada", tendo este sido remetido à PGR no dia seguinte à homologação.
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