O "não é não" transformou-se em "não é sim"? Depois de ter assumido que o Governo estabeleceu "um acordo de princípio sobre o chamado pacote da imigração" com o Chega, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Carlos Abreu Amorim, esclareceu, no sábado, que "não há acordo que tenha durabilidade" com o partido de André Ventura, tal como asseverado pelo primeiro-ministro. Ainda assim, o secretário-geral do Partido Socialista (PS), José Luís Carneiro, instou Luís Montenegro "a dizer a verdade", já que "há muito tempo que não tínhamos um ministro a desmentir o primeiro-ministro".
"Não vamos alimentar polémicas inconsequentes, que são estéreis; isso não interessa nada aos portugueses. Em relação a essa matéria, o senhor primeiro-ministro foi completamente claro: não há acordo que tenha durabilidade, não há acordo que seja incidental, numa ou noutra proposta, e nós conversamos com todos os partidos e fazemos acordos com todos os partidos", replicou Abreu Amorim, quando questionado se desmentiu Luís Montenegro ao dizer que ocorreu "um acordo de princípio" com o Chega em matéria de imigração, no final da X Convenção Nacional da Iniciativa Liberal (IL).
O responsável foi mais longe, tendo apontado que não houve "nem princípio de acordo, nem acordo de princípio". "Aquilo que acontece é que vamos governar com o nosso programa e, para isso, falaremos com todos os grupos parlamentares."
"Vamos falar com todos os partidos, obviamente privilegiando aqueles que têm grupos parlamentares que permitam passar as nossas propostas e diplomas. Portanto, não há qualquer questão em relação a tentar encontrar uma duplicidade ou algumas divergências nas declarações, porque aquilo que disse o senhor primeiro-ministro é exatamente aquilo que é dito por todos os membros do Governo: fazemos entendimentos e buscamos entendimentos com todos os partidos e com todos os grupos parlamentares dentro da nossa linha de rumo, que é o programa do Governo", complementou.
Mas, recorde-se, Carlos Abreu Amorim admitiu, em entrevista à Rádio Observador, que o Executivo estabeleceu "um acordo de princípio" com o Chega, no que diz respeito à imigração e ao IRS, tendo dado conta de que estão em curso conversas sobre o regime jurídico do Ensino Superior, após Luís Montenegro ter dito desconhecer do que se tratava esse "acordo de princípio" revelado por André Ventura, no debate do Estado da Nação.
Também no sábado, José Luís Carneiro atirou que "só mesmo o primeiro-ministro pode responder à questão sobre por que é que há um ministro que desmente o primeiro-ministro".
"Há muito tempo que não tínhamos um ministro a desmentir o primeiro-ministro. Na entrevista do ministro dos Assuntos Parlamentares, o doutor Carlos Abreu Amorim, por quem tenho muita estima, disse a verdade. Disse que, de facto, havia um acordo com o Chega, que agora, a todo custo, estão a tentar negar", considerou.
Nessa linha, o líder dos socialistas indicou que "é preciso perguntar ao primeiro-ministro quem fala a verdade; se é o primeiro-ministro, que disse no Parlamento que não havia acordo, ou se é o ministro dos Assuntos Parlamentares, que hoje [sábado] disse que havia acordo".
Por seu turno, o ex-ministro do Trabalho e da Segurança Social, José Vieira da Silva, acusou Montenegro de "fazer uma aliança efetiva com a extrema-direita", ao mesmo tempo que desaconselhou o PS a colocar-se "em bicos dos pés para ser parceiro preferencial" do Executivo.
"Por razões que a razão desconhece, Luís Montenegro e o seu Governo acabaram de fazer uma aliança efetiva com a extrema-direita. E a extrema-direita em Portugal, como em muitos outros países, tem um discurso que se centra muito na xenofobia, muitas vezes no racismo e na culpabilização de todos os males do mundo na imigração", disse, em declarações ao programa Conversa Capital, da Antena 1 e Jornal de Negócios.
Note-se que o "não é não" imposto por Luís Montenegro ao Chega remonta às eleições antecipadas de 2024, princípio que o primeiro-ministro considerou válido para o sufrágio deste ano, durante o frente a frente com André Ventura. Nessa ocasião, indicou, aliás, ser "impossível" governar com o Chega, uma vez que aquele partido "não tem fiabilidade de pensamento", "comporta-se como um cata-vento" político e "não tem maturidade, nem decência". Durante o debate televisivo, o líder do Executivo acusou também André Ventura de apresentar "um pendor destrutivo" e de não ter "vocação de Governo".
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