Não foi greve, mas... por que Gyokeres pôde faltar ao trabalho e eu não?

Em declarações exclusivas ao Desporto ao Minuto, Gonçalo Almeida - advogado especializado em direito desportivo - pronunciou-se acerca da 'novela' entre Viktor Gyokeres e Sporting, e as questões legais envolvidas caso o avançado sueco continue a não se apresentar ao trabalho.

Viktor Gyokeres participates in the Liga Portugal Betclic match between Sporting CP and Vitoria SC at Estadio Jose de Alvalade in Lisbon, Portugal, on May 17, 2025. (Photo by Valter Gouveia/NurPhoto via Getty Images)

© Getty Images

Davide Rodrigues Araújo
23/07/2025 06:45 ‧ há 8 horas por Davide Rodrigues Araújo

Desporto

Exclusivo

A 'novela' a três entre Viktor Gyokeres, o Sporting e o Arsenal já dura há várias 'temporadas', mas parece que estará mesmo a chegar ao 'último episódio", com os dias em que o avançado do sueco está sem se apresentar no clube de Alvalade ainda continuam a aumentar.

 

Esta forma de estar do ponta de lança durante as negociações, que se encontra alegadamente de férias na ilha espanhola de Mallorca, enquanto os seus colegas de equipa trabalham, acaba por levantar uma questão. Por que é que Viktor Gyokeres se pode não apresentar ao trabalho após as férias e os trabalhadores 'comuns' não? Ora, vamos tentar perceber.

Em declarações exclusivas ao Desporto ao Minuto, Gonçalo Almeida, advogado especializado em direito desportivo, abordou a questão legal em causa face ao não comparecimento de Viktor Gyokeres no regresso aos trabalhos do Sporting, analisando as várias possibilidades para os próximos passos desta 'novela'.

O que está em causa neste momento

Viktor Gyokeres não se apresentou no regresso para os jogadores do Sporting à data que lhe foi imposta, tendo continuado a marcar a sua ausência ao longo de toda a duração do estágio da equipa de Rui Borges em Lagos, no Algarve.

Ainda assim, não foi anunciado qualquer tipo de sanção ao internacional sueco, nem dada qualquer justificação pela qual a data de apresentação era diferente dos restantes jogadores que estiveram envolvidos em compromissos internacionais pelas respetivas seleções. Mas vamos por partes, 'à boleia' de Gonçalo Almeida, que nos conta o que poderia ter acontecido caso a situação se tivesse mantido por mais tempo.

"Aquilo que, do ponto de vista técnico, o Gyokeres está a fazer não é nenhuma greve. O que ele está a fazer é um incumprimento das suas obrigações contratuais. No entanto, sem ter acesso ao contrato de trabalho desportivo, estamos a tecer comentários com base nas questões hipotéticas, contratualmente falando. Esta questão parece-me clara em como, existindo o contrato de trabalho desportivo, as obrigações do Gyokeres são de se apresentar para os treinos da equipa", começou por dizer o advogado desportivo. 

"Não o fazendo aquando da notificação do Sporting para se apresentar ao serviço, está a violar as suas obrigações contratuais para com o Sporting. Isso parece-me claro e inequívoco. Não estamos a falar de nenhuma greve. Não é disso que se trata. Isto é um 'finca pé'. Numa questão de princípio para cada uma das partes, independentemente do que terá sido acordado verbalmente, parece-me que o atleta persiste numa conduta violadora do contrato de trabalho desportivo", continuou.

"Portanto, o incumprimento, se persistir, o Sporting porventura avançará com a abertura de um processo disciplinar que culminará com as sanções disciplinares que entender mais apropriadas. Neste caso, o contexto ultrapassa a mera relação laboral, já que, atendendo à especificidade do futebol enquanto desporto, os jogadores são ativos. Tanto é que a questão está diretamente relacionada com o valor que o atleta tem enquanto ativo da SAD do Sporting", acrescentou.

"Acredito que, em condições normais, já teria sido aberto um processo disciplinar, se é que já não o foi, e aí, provavelmente, culminaria numa multa ou sanções até mais gravosas. Caso a situação persista, poderá eventualmente culminar com o abandono do trabalho", completou Gonçalo Almeida, antes de revelar quais as possíveis sanções em cima da mesa.

"Abandono do trabalho ocorre quando o jogador falta ao serviço e demonstra intenção de não regressar. Esta ausência pressupõe, normalmente, uma ausência prolongada, pelo menos de 15 dias úteis seguidos, sem comunicação do motivo ao clube. ⁠É considerado como uma rescisão sem justa causa por parte do jogador, equiparada a uma rescisão ilícita, em que o clube pode exigir indemnização conforme previsto na lei. ⁠No entanto, só poderá ser declarado abandono após o clube enviar uma carta registada com aviso de receção para o último endereço conhecido do jogador", confirmou ao Desporto ao Minuto.

"Até tive, há muitos, anos um processo com o Co Adriaanse, quando era advogado do FC Porto, e, nesse caso em concreto, o treinador neerlandês abandonou o trabalho em definitivo", referiu, lembrando o caso em que o técnico dos Países Baixos deixou o estágio nesse mesmo país, antes da partida para Inglaterra, onde os dragões iriam defrontar o Portsmouth. De relembrar que o treinador foi fortemente contestado pelos membros da claque dos Super Dragões.

"Mas esta questão da rescisão de contrato com os ativos, e neste caso trata-se de um excelente ativo, quer desportivamente quer financeiramente, terá de ser bem equacionada por parte do Sporting, porque esta seria uma medida drástica, algo radical até, ainda que perfeitamente sustentada na lei", reiterou.

"Uma coisa é rescindir contrato com um jogador que não é relevante no ponto de vista desportivo ou do seu valor de mercado ser insignificante. Outra coisa é rescindir um contrato com um jogador que é a mais-valia no caso de ficar, aquele que fez a diferença pelo menos na conquista dos dois últimos campeonatos, e que do ponto de vista financeiro vale, à partida, largas dezenas de milhões de euros", frisou Gonçalo Almeida. 

"Tem de ser uma estratégia muito bem delineada pela SAD. Agora, enquanto advogado, se me perguntasse, e não tendo acesso ao contrato de trabalho desportivo, qualquer jogador que se coloque nesta situação, haveria a justa causa para rescindir o contrato a partir do momento em que há o abandono do trabalho", analisou o advogado especializado em direito desportivo.

"Até lá, a entidade patronal tem toda a legitimidade para instaurar um processo disciplinar e, na sequência desse processo disciplinar, que obedece a uma notificação da nota de culpa, a uma resposta, e depois se resolverá, ou não, na aplicação de sanções. Poderá ser à base de multas, ou até chegar a ter uma sanção mais gravosa", afirmou.

Com uma rescisão, há indemnização por parte do novo clube de Gyokeres?

A eventualidade de uma rescisão unilateral é cada vez mais improvável, já que o negócio estará praticamente fechado entre todas as partes envolvidas. No entanto, dado que ainda não é 100% oficial, é importante sabermos o que aconteceria caso houvesse essa tomada de decisão por parte dos responsáveis leoninos.

"Uma vez mais é importante frisar que não conhecemos o contrato de trabalho desportivo existente entre Gyokeres e o Sporting. Isso é importante para percebermos, logo à partida, qual é o tribunal a quem pertence a jurisdição para decidir sobre este litígio. Será que são os tribunais de trabalho em Portugal? Será que é o Tribunal Arbitral do Desporto na Suíça? Será que é a FIFA? Qualquer um destes cenários é passível de constar numa cláusula compromissória - que definem o foro e quem tem essa jurisdição", explicou.

"Caso seja a FIFA, à partida sim, poderá haver lugar a uma indemnização, até porque, o artigo 17.º do regulamento relativo ao estatuto e transferências de jogadores da FIFA, estipula de forma clara que salvo disposição em contrário no contrato, a compensação por incumprimento deverá ser calculada com base nos danos sofridos, de acordo com o princípio do “positive interest”, tendo em conta os factos e circunstâncias concretos de cada caso, e considerando a legislação do país em causa" confessou. 

"Os referidos critérios incluem em particular a remuneração e outros benefícios pagos ao jogador nos termos do contrato actual e/ou do novo contrato, o tempo restante do contrato até um máximo de cinco anos, custos e despesas pagos ou incorridos pelo Clube Anterior (amortizados ao longo da vigência do contrato) e se a rescisão contratual ocorre num Período Protegido. Este é mesmo o caso, já que o Período Protegido acontece nos primeiros três anos de um contrato com a duração inicial de cinco anos com menos de 28 anos de idade, algo que aconteceu quando Gyokeres assinou com o Sporting", acabou por dizer Gonçalo Almeida.

"Teria de ser também analisado o contrato para perceber se existe uma cláusula penal, ou seja, uma cláusula que em caso de incumprimento ou rescisão de um contrato de trabalho desportivo, esse montante terá de ser tido em conta para calcular a compensação exigida à entidade patronal. Não existindo esta cláusula penal, teremos de fazer um cálculo de várias nuances, nomeadamente face aos remanescentes, os montantes que foram dispendidos durante o período do contrato, montantes pagos eventualmente a título de comissão e ainda outras despesas com a contratação do jogador", complementou.

"Estando no Período Protegido, existe aqui uma agravante no cálculo desta indemnização. Se o Sporting conseguir comprovar que teve danos muito superiores com esta rescisão, como por exemplo, a proposta que teve do Arsenal terá de ser tida em conta no desfecho total da compensação a pagar."

E se Gyokeres tivesse um trabalho 'normal'?

Conforme Gonçalo Almeida tem vindo a explicar, é percetível que o fator financeiro que os jogadores detêm enquanto ativos fazem com que tenham uma condição especial nestas vias legais. Mas imagine-se que este não era o caso e que Viktor Gyokeres tinha um trabalho dito 'normal'. Como seria? Vamos descobrir.

"Provavelmente já tinha um processo disciplinar que, se a entidade patronal assim o desejasse, culminaria no despedimento por justa causa, com o termo da relação laboral. Mas lá está, a especificidade do desporto é mesmo esta. No caso do Gyokeres, o funcionário é um ativo. Se se tratasse de uma relação laboral comum, fosse em que área fosse, não passaria de um funcionário da entidade, em termos de mão de obra, pelo que no futebol é completamente distinto", concluiu o advogado.

Leia Também: Acordo fechado. Gyokeres vai deixar o Sporting rumo ao Arsenal

Leia Também: "Só quero o Arsenal". Gyokeres 'bate o pé' ao Sporting e rejeita Amorim

Leia Também: Gyokeres está na praia à espera do Arsenal e do Sporting

Partilhe a notícia

Escolha do ocnsumidor 2025

Descarregue a nossa App gratuita

Nono ano consecutivo Escolha do Consumidor para Imprensa Online e eleito o produto do ano 2024.

* Estudo da e Netsonda, nov. e dez. 2023 produtodoano- pt.com
App androidApp iOS

Recomendados para si

Leia também

Últimas notícias


Rede social

As fotos das férias da família de Ricardo Quaresma (em Portugal e não só)

Ricardo Quaresma

As fotos das férias da família de Ricardo Quaresma (em Portugal e não só)

Liga portuguesa

ClubeJPts
1AVS00
2Alverca00
3Arouca00
4Benfica00
5C.D. Nacional00
6Casa Pia00
7Estoril00
8Estrela00
9FC Porto00
10Famalicão00
11Gil Vicente00
12Moreirense00
13Rio Ave00
14Santa Clara00
15Sp. Braga00
16Sporting00
17Tondela00
18Vitória SC00
Liga dos CampeõesLiga EuropaDesporomoção

Sobre rodas

Fórmula 1 a 'meio caminho' de chegar à neutralidade carbónica até 2030

Fórmula 1

Fórmula 1 a 'meio caminho' de chegar à neutralidade carbónica até 2030

Newsletter

Receba os principais destaques todos os dias no seu email.

Mais lidas