"Governo, escuta, queremos vida justa", gritaram, com auxílio de megafones, recordando que "a cidade é para morar, não é só para trabalhar".
Chegados de autocarros ao centro da capital, moradores dos bairros de Penajóia e Raposo, em Almada, Santa Marta, no Seixal, Talude e Quinta do Mocho, em Loures, Estrada Militar, na Amadora, concentraram-se para avisar que estão "juntos" e "fortes".
Apoiados por várias associações e coletivos, signatários da carta aberta, entoaram "o povo unido jamais será vencido" e exigiram "nem menos, nem mais, direitos iguais".
A convocatória para a concentração partiu do movimento Vida Justa, em defesa de um plano de emergência nacional para a habitação.
"O Governo não vê o povo, o Governo não nos vê, a nós, há muitos anos", lamentou Luísa Semedo, do Vida Justa, em declarações à Lusa depois de se terem ouvido vários testemunhos de pessoas alvo de despejos e demolições.
"Não somos uma organização que tem casas na mão", notou a ativista, desmentindo que o Vida Justa ande "a manipular as pessoas".
Ao contrário, tem sido "um recurso, para as orientar", proporcionando-lhes, por exemplo, o transporte que hoje as levou até à sede do Governo, algo importante "tendo em conta a distância" dos bairros sociais.
Ocupando a rua em frente à sede do Governo, ouviram-se de boca própria as histórias de Osvaldo, que dorme há um ano no chão de uma escola, com a mulher e os filhos, continuando a trabalhar e a contribuir há quatro anos para o Estado português; de Teresa, "muito triste" com a vida que cá leva, onde lhe chamam ora "preta", ora "negra", mas não a veem como pessoa; de Andreia, que lembrou que "ninguém quer viver num sítio onde nem vai táxi nem ambulância".
Estas e outras pessoas "trabalham, contribuem, produzem riqueza", situa Flávio Almada, do Vida Justa, que integrou a delegação que entregou a carta aberta, prometendo, à saída, "determinação" para continuar a reivindicar "uma luta de todos".
A carta aberta "Parar os despejos e resolver a situação da habitação" contou com mais de 3.200 subscrições individuais e cerca de 150 organizações apoiantes, o que "superou as expectativas", notou Engels Amaral, representante dos moradores do Talude Militar, que também integrou a delegação que hoje entregou o documento na sede do Governo.
Em declarações à Lusa, à saída, Engels Amaral relatou que foram "bem recebidos" e que entregaram a carta ao secretário-geral adjunto, que se comprometeu a passá-la ao Governo.
"O problema atual da habitação não é só um problema dos bairros, é um problema do país", sublinhou, instando o Governo a adotar um plano nacional de emergência habitacional.
Em concreto, o movimento Vida Justa pede uma resposta para as "mais de 90 famílias sem casa e mais de 60 crianças a viver na rua" nos bairros do Talude Militar e da Estrada Militar da Mina de Água, onde as autarquias, de Loures e Amadora, respetivamente, ordenaram este mês a demolição de construções precárias.
O Vida Justa contabiliza "23 bairros de barracas na Grande Lisboa" e assinala que "há cada vez mais famílias trabalhadoras que não conseguem alugar uma casa e nem sequer um quarto".
Dirigindo-se em concreto às autarquias de Loures e Amadora, o movimento lamenta que "a única coisa que fazem é criminalizar as populações trabalhadoras e deitar para as costas delas a culpa de uma política criminosa".
O Vida Justa acusa ainda Governo e autarquias de nada fazerem para resolver o problema e exige "soluções reais" para o que considera ser uma "catástrofe humanitária".
Os municípios de Loures e Amadora, no distrito de Lisboa e ambos presididos pelo PS, realizaram em meados de julho operações de demolição de casas precárias construídas pelos habitantes, gerando contestação.
[Notícia atualizada às 21h57]
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