A bombeira Alexandra Almeida, candidata a vice-presidente da Câmara Municipal de Alpiarça, no distrito de Santarém, revelou nas redes sociais que esteve a combater durante "mais de 24 horas" o "monstro do fogo" em Piódão e Covilhã.
"Arde floresta, ardem memórias, ardem vidas de quem sempre cuidou da terra", começou por dizer, adiantando que, enquanto esteve no terreno, o "descanso [foi] pouco".
Mas Alexandra vai mais longe e faz duras críticas à "falta de planeamento, de gestão florestal e à ausência total de prevenção" dos incêndios florestais.
"Ano após ano, tudo se repete. Somos bombeiros a correr atrás do prejuízo, sempre a remendar o que nunca foi prevenido. Pedrógão foi há oito anos. Morreram 66 pessoas, morreram bombeiros, e prometeram-nos mudanças. Onde estão?! Nada mudou", escreveu, salientando que "continuamos a combater incêndios em terrenos totalmente abandonados, sem acessos, com mato até ao joelho, sem faixas de contenção, sem as mínimas condições de combate".
"Continuamos a ver colegas a morrer! Continuamos a aceitar receber um valor hora vergonhoso, miserável, que não tem nada a ver com o que passamos em cada teatro de operações", atirou na publicação que já tem mais de 6 mil partilhas, 2 mil reações e duas centenas de comentários, em apenas algumas horas.
"E depois, quando tudo arde, surge sempre a mesma questão: quem ganha com isto?! A terra arde e no lugar da floresta aparece um campo de painéis solares. A terra arde e logo a seguir surgem interesses no lítio, nas minas, nos parques eólicos. É assim que se faz 'gestão do território' em Portugal: deixa-se arder e depois entrega-se ao privado. Os mesmos que falham na prevenção são muitas vezes os mesmos que abrem portas para o negócio depois da tragédia", acusou ainda.
Revoltada com a situação, a social-democrata defendeu ainda que o país só se lembra dos bombeiros "no momento da fotografia".
"Chamam-nos heróis quando tudo arde e mais ainda quando morremos. Mas quando o fogo se apaga, voltamos a ser os mesmos de sempre. O país só se lembra dos bombeiros no momento da fotografia, nunca no momento de nos dar dignidade. Eu estive lá, mais de 24 horas a respirar fumo, a carregar lances de mangueiras, a suportar o calor das chamas, a lutar contra o cansaço. Dei agora lugar a outra equipa, que seguirá na mesma luta desigual. E digo-vos: não estamos só a combater incêndio. Estamos a combater um sistema que vive da tragédia, do esquecimento e do interesse", disse, realçando que "enquanto continuarmos a varrer as cinzas para debaixo do tapete, Portugal vai continuar a arder".
"Enquanto os interesses privados falarem mais alto que a vida das pessoas, a floresta e os bombeiros vão continuar a ser descartáveis. Enquanto não houver coragem, nós vamos continuar a ser o último escudo. Mal pago, mal lembrado, mas sempre presente. Enquanto existirem isqueiros com pernas, este terrorismo não vai acabar. Força e muita coragem para os que ainda tentam salvar alguma coisa e alguém. Que não digam depois que ninguém avisou", concluiu a bombeira.
Recorde-se que todos os dias, desde o dia 2 de agosto, à volta de 4 mil bombeiros têm combatido as chamas que fustigam o Centro e Norte do país, destruindo hectares e hectares de floresta, provocando danos em habitações, no habitat de animais.
Duas pessoas, entre os quais um bombeiro, já morreram na sequência do combate aos incêndios este mês de agosto.
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