China indignada com partilha de vídeos íntimos. O que diz a Telegram?

O escândalo teve lugar na China e diz respeito a um grupo que partilhou conteúdos pornográficos não consensuais com centenas de milhares de utilizadores. Alguns deles chegaram a partilhar na Telegram imagens e vídeos de familiares do sexo feminino e também de atuais e ex-namoradas.

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Miguel Patinha Dias com Lusa
29/07/2025 22:32 ‧ ontem por Miguel Patinha Dias com Lusa

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Para muitas pessoas a aplicação de mensagens encriptadas Telegram já se tornou sinónimo de partilha de imagens de raparigas e mulheres sem consentimento, mas um  novo caso na China está a ganhar novas proporções e a indignar os internautas.

 

Isto porque um grupo de conversa na aplicação - com o nome MaskPark Tree Hole Forum - divulgou várias imagens de mulheres a centenas de milhares de utilizadores na conversa, com as hashtags relacionadas a ultrapassarem os 270 milhões de visualizações nesta terça-feira, dia 29, na rede social chinesa Weibo.

A existência do grupo na Telegram começou por ser reportada pelo jornal estatal Southern Daily, com a Reuters a também ter publicado uma reportagem sobre o tema. Ao que parece, as fotografias foram partilhadas por utilizadores e dizem respeito a imagens privadas das familiares bem como das atuais e ex-namoradas. Alegadamente, as imagens foram captadas não só em privado, como também em outros locais como casas de banho públicas.

“O meu ex-namorado tirou fotografias em segredo de mim enquanto tínhamos relações sexuais, partilhou as minhas fotografias privadas no grupo sem a minha permissão e promoveu as minhas contas nas redes sociais”, contou ao meio de comunicação chinês uma das vítimas, que decidiu permanecer anónima.

Serve recordar que, apesar de a China ter leis rígidas no que diz respeito a conteúdos obscenos ou considerados pornográficos, com muitos internautas chineses a recorrerem a redes virtuais privadas (VPNs) para conseguirem aceder a conteúdo bloqueado no país ou a plataformas proibidas - como é o caso da Telegram.

No caso da Telegram, a empresa já se pronunciou oficialmente sobre o caso e afirma que a partilha de conteúdo pornográfico não consensual é estritamente proibido pela aplicação. Sabe-se que o grupo onde as imagens foram partilhadas foi encerrado, ainda que continuem ativos grupos mais pequenos que continuam a partilhar estas imagens.

“A partilha não consensual de pornografia é explicitamente proibida pelos termos de utilização da Telegram e é removida sempre que é descoberta”, pode ler-se no comunicado da Telegram partilhado com a Reuters. “Os moderadores vigiam de forma proativa partes públicas da plataforma e aceitam denúncias de forma a remover milhões de conteúdos perigosos todos os dias, incluindo a pornografia não consensual”.

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"Normalização do discurso de ódio contra as mulheres"

Recordar que também Portugal foi assolado este ano por escândalos com a partilha de fotografias e vídeos íntimos através da Telegram, com académicos, ativistas e diferentes associações a defenderem uma uma intervenção política na machosfera - que, dizem, promove a violência 'online' sobre mulheres.

"Não há nada de normal num grupo de Telegram em que se partilham fotos de raparigas e mulheres sem consentimento, se partilham moradas e muitas vezes se organizam ataques sexuais concertados. É isso que acontece nestes grupos. Isto é conhecido. É de uma irresponsabilidade tremenda que não estejam todos os partidos políticos alinhados e na fila da frente para combater esta realidade", censura Paula Cosme Pinto, ativista pela igualdade de género.

Perante a "normalização do discurso de ódio contra as mulheres", importa "que a lei faça o seu trabalho" e "o que ainda não é punido por lei tem de passar a ser", algo que tem de se somar à educação para a igualdade e sexualidade.

Inês Marinho, fundadora da Associação Não Partilhes, defende "reformas na lei" para proteger as vítimas com "penas mais severas", impedindo o acesso à Internet de "pessoas condenadas ou em processos de denúncia por crimes cometidos 'online'".

Maria João Faustino, especialista em violência sexual, pede a "responsabilização" das plataformas.

"Basta procurar qualquer coisa, até relativamente inócua, mas ligada ao universo masculino, para que o algoritmo ofereça um crescendo de conteúdos cada vez mais extremados", conta.

Para a especialista, "é muito fácil culpar os jovens e as famílias, como se coubesse unicamente às famílias responder a isto", mas estes são "problemas mais amplos e há responsabilidades coletivas" às quais a sociedade se tem furtado.

O problema é social e precisa de "intervenção preventiva", nomeadamente de "educação para a sexualidade e igualdade desde muito cedo".

A sociedade permitiu que "a misoginia galopante não fosse tratada devidamente nas escolas, com políticas públicas" e homens e rapazes "são socializados numa cultura que promove a violência contra as mulheres, que se glorifica na pornografia, nos videojogos ou no entretenimento", lamenta.

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Diana Pinto, da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, repara que a pornografia, "incentivada nos fóruns onde se promove o ódio contra as mulheres", é um "dispositivo de socialização onde se aprende que a violência é excitante, que o consentimento é irrelevante e o prazer das mulheres é secundário ou inexistente".

O resultado são "novas gerações com ideias profundamente distorcidas sobre intimidade, consentimento, prazer mútuo e igualdade".

Para a Plataforma, há "um problema estrutural que não se resolve apenas com a alteração penal". É preciso "a desconstrução da cultura da violência, dos estereótipos sexistas e de género", um "trabalho mais lento, mas cada vez mais urgente".

O problema "é político", assegura Tiago Rolino, jurista, gestor de investigação e ativista.

"Não só é político, porque precisamos de políticas públicas robustas que alterem a situação, mas porque o pessoal é político e tudo o que fazemos tem uma consequência em todos nós", analisa.

Educar, criminalizar e criar uma definição da violência 'online' é o que sugere Inês Amaral, investigadora do Observatório de Masculinidades do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.

Nos casos das vítimas de violência sexual 'online', é "muito difícil chegar a uma condenação justa", reconhece Joana Sales, da UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta. "É raríssimo. Com o anonimato e os perfis falsos é difícil provar quem fez, quem partilhou. E, uma vez 'online', fica para sempre".

A vice-presidente da FEM - Feministas em Movimento, Sandra Cunha, pede "regulação e limite" para as plataformas, considerando que "em algum momento este tema tem de estar na agenda política", nomeadamente na da União Europeia.

Defende ainda a "educação para a cidadania, a igualdade, o respeito", que também está sob constante ataque por parte da extrema-direita.

"O problema da ciberviolência nas escolas é uma coisa impressionante. Não há uma escola em que não haja casos que tomam proporções enormes num instante", revela.

"Na rua, as pessoas não podem dizer o que entendem a outra pessoa. É crime, é discurso de ódio. Então, na internet também não podem", sublinha.

Leia Também: CEO da Telegram, Pavel Durov, quer deixar riqueza aos mais de 100 filhos

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