Os distúrbios e os confrontos entre grupos alegadamente de extrema-direita e residentes em Torre Pacheco (região de Múrcia), onde 30% da população de 40 mil pessoas é imigrante ou de origem estrangeira, ocorreram nas últimas três noites e surgiram após um homem de 68 anos da localidade ter sido agredido por jovens sem razão aparente, segundo contou a própria vítima, na quinta-feira passada, a meios de comunicação social.
O agredido disse que os jovens eram de origem magrebina. Além do relato da vítima, circula também na Internet um vídeo da agressão.
O Governo espanhol revelou hoje que foram detidas nove pessoas desde sábado à noite, incluindo duas suspeitas de estarem relacionadas com a agressão ao homem de 68 anos e que não são residentes em Torre Pacheco, não sendo ainda claro o motivo do ataque porque não roubaram nada à vítima.
As outras sete pessoas foram detidas por causa dos distúrbios das últimas três noites e são suspeitas de crimes de ódio, agressões e desordem pública, disse a delegada do Governo na região de Múrcia, Mariola Guevara.
Foram ainda identificadas 80 pessoas, "muitas com antecedentes por atos violentos", e foram abertos cerca de 30 processos pelas forças de segurança, segundo Mariola Guevara.
"Detetámos a organização de uma chamada 'caçada' para os dias 15, 16 e 16, o que permitiu antecipar um dispositivo policial de prevenção que conteve a situação", revelou.
O ministro da Administração Interna de Espanha, Fernando Grande-Marlaska, disse hoje que por trás dos distúrbios estão "grupos organizados" que se têm deslocado de outros pontos a Torre Pacheco e culpou ao partido de extrema-direita Vox.
"É culpa do Vox e culpa dos discursos como o do Vox", disse Fernando Grande-Marlaska num entrevista à rádio Cadena Ser.
O ministro afirmou que ainda este fim de semana o líder do Vox, Santiago Abascal, usou "a maior das falsidades" ao falar em "invasão criminosa" que "roubou a paz e a prosperidade" a Espanha, referindo-se à imigração, quando "não há nenhuma identificação entre delinquência e imigração", como demonstram todas as estatísticas oficiais.
As forças de segurança espanholas mobilizaram um dispositivo especial para Torre Pacheco nas últimas noites e, segundo o presidente da câmara, Pedro Ángel Roca, a última madrugada já foi mais calma.
O ministro Grande-Marlaska afirmou que é evidente que por trás dos distúrbios estão "grupos organizados", que se mobilizam e coordenam nas redes sociais, e sublinhou que as forças de segurança identificaram só na última noite "mais de 20 veículos que tentavam" entrar na localidade e que dentro de alguns deles havia objetos perigosos, como paus ou bastões.
O autarca Pedro Ángel Roca disse hoje, em declarações à televisão pública espanhola (RTVE), que os distúrbios têm ocorrido entre "grupos que vêm de fora" e grupos de imigrantes ou de origem imigrante que vivem na localidade.
"Não estamos a pedir que venha ninguém aqui. Não faz falta vir ninguém. Resolvemos os problemas entre os 'pachequeiros' e com as forças de segurança", disse o presidente da câmara de Torre Pacheco, que pediu também aos residentes no bairro para ficarem em casa e não procurarem o confronto com "os que vêm de fora".
Segundo o autarca, há cerca de 90 nacionalidades em Torre Pacheco e que a maioria da população imigrante é do norte de África, sobretudo pessoas que se instalaram na zona para trabalhar na agricultura, algumas há várias décadas, com os filhos já nascidos em Espanha.
Pedro Ángel Roca disse que tem havido um aumento de delinquência nos últimos tempos na localidade, mas que vê "tranquilidade entre os habitantes", que há convivência entre várias nacionalidades há muitos anos, e que ficou surpreendido com os acontecimentos e a violência dos últimos dias.
O Partido Popular (PP, direita), que está à frente do município e do governo regional e lidera a oposição em Espanha, apelou hoje à serenidade, ao reforço dos dispositivos policiais e manifestou solidariedade com o homem agredido na semana passada, ao mesmo tempo que condenou os discursos que querem aproveitar um acontecimento como este para "incendiar ainda mais as ruas".
Já o líder do Vox, Santiago Abascal, reiterou hoje a associação entre imigração e crime, negada pelas estatísticas, e voltou a defender a "deportação massiva" de estrangeiros, incluindo imigrantes em situação legal em Espanha que sejam associados a delinquência.
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